Quem são os verdadeiros assassinos dos mares?

Todo ano, no período de abril a junho, a Região dos Lagos (RJ) recebe a visita de diversos grupos de tubarões da espécie galha-preta, que ali se juntam atraídos pelos cardumes de xereletes e tainhas. Na perseguição, os tubarões obrigam os xereletes e tainhas a se aproximarem da costa e vêm juntos, tornando-se presas fáceis para as redes dos pescadores. E a cena repete-se quase todos os anos em Arraial do Cabo: centenas de tubarões capturados, mortos e expostos na praia.

Poderíamos pensar: são humildes pescadores ganhando o pão-nosso-de-cada-dia. Porém, infelizmente, esses pescadores têm plena consciência de que estão dando “um tiro no pé”. Exibir ao público e à imprensa os corpos do tubarões mortos como sendo os “temidos” cabeças-chatas (espécie responsável pelos poucos ataques que eventualmente ocorrem em Recife) parece uma tentativa de obter o aval da população local para a matança dos “comedores de homens”, e disfarça um lado ganancioso dos pescadores locais: a venda da carne e, principalmente, das barbatanas desses tubarões, que proporcionam uma boa renda extra.

 

 

Cerca de 90% dos pescadores relatam queda no rendimento de suas pescarias e 65% relatam diminuição no tamanho médio do pescado capturado. Ou seja, eles sabem perfeitamente que a quantidade e o tamanho dos tubarões estão diminuindo a olhos vistos. Se sabemos que o tamanho das populações de tubarões não sofre grande impacto com a poluição ambiental, devemos nos atentar para o problema da baixa reprodutividade que os torna muito vulneráveis à sobrepesca (pesca exagerada) e à pesca predatória.

E nesses episódios, os pescadores extrapolaram os limites do bom-senso. Capturar uma quantidade muito grande de tubarões em um curto intervalo de tempo e em uma mesma área, torna a pesca insustentável e pode criar a curtíssimo prazo um forte desequilíbrio na teia alimentar da região. Não se retira do ambiente marinho 350 animais em poucas horas sem que a Natureza reclame. Ainda mais quando se tem o agravante da maioria ser composta por fêmeas, muitas delas grávidas. Acrescente-se a isso o fato de que essas fêmeas levaram de 10 a 15 anos para atingir sua maturidade sexual.

Já está na hora de abordarmos um ponto controverso, mas muito importante: a questão da proteção e conservação das populações de tubarões que vivem em nosso litoral. Não podemos mais deixar nas mãos dos pescadores a responsabilidade pelo gerenciamento dos estoques pesqueiros.

Atualmente, temos cerca de 70 a 90 ataques de tubarão por ano no mundo todo. Estatísticas da FAO (órgão das Nações Unidas) estimam que 100 a 150 milhões de tubarões são mortos anualmente em todos os oceanos. Uma única fábrica na Costa Rica mata 235 mil tubarões por mês para transformá-los em cápsula de cartilagem. Quem são os verdadeiros assassinos dos mares?

 

 

 

 

Sobre Marcelo Szpilman

Marcelo Szpilman, biólogo marinho, é autor de oito livros publicados, sendo cinco nas áreas de peixes, tubarões e outros seres marinhos. É o idealizador, fundador e presidente de honra do AquaRio e diretor-presidente do Instituto de Conservação Marinha.

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