AquaRio e James Bond. Qual a ligação?

Programas de TV das décadas de 1960 e 1970, como o Mundo Animal e as Aventuras de Flipper, povoaram a mente e conectaram gerações de crianças e adolescentes com a natureza selvagem. Muitas delas foram motivadas a sonhar com um futuro trabalho com animais. Fui uma delas. Ainda naquela época, a famosa praia de Copacabana foi o playground onde peguei muito jacaré (onda de peito). Além disso, pesquei no Píer de Ipanema e surfei no Arpoador. Como eu, muitos jovens tiveram nessas atividades as primeiras experiências com o ambiente marinho. Aos 12 anos, me iniciei no mundo dos peixes costeiros através da pesca submarina.

Apesar desse retrospecto, se você perguntar qual foi o “click” que me despertou o interesse pela biologia marinha, respondo na certa que foi o filme “007 – O espião que me amava”, de 1977. Mais especificamente, Bond, James Bond. Disfarçado de biólogo marinho, o charmoso detetive secreto visita o vilão do filme em seu laboratório submarino chamado Atlantis. Na tentativa de desmascará-lo, o vilão testa seus conhecimentos perguntando o nome científico de alguns peixes que passam pelo grande visor. E não é que James Bond responde na lata? Fiquei fascinado.

 

 

Na época já conhecia bem os peixes por seus nomes comuns, porém aquela conciliação da prática com a ciência me captou. Não foi por outra razão que, depois de formado em biologia marinha, escrevi e publiquei cinco livros de identificação de peixes, tubarões e outros seres marinhos.

Em 2004, após criar o Projeto Tubarões no Brasil, e influenciado pelo brilhante trabalho do Projeto Tamar, que em suas bases consegue aplicar uma das máximas de Jacques Cousteau __ “Só se preserva aquilo que se conhece” __, ao proporcionar o contato bem próximo das pessoas com as tartarugas marinhas, seus ovos e filhotes, a meu ver uma das razões de seu grande sucesso, passei a refletir sobre como fazer com que as pessoas tivessem esse tipo de interação com os tubarões.

Sempre acreditei que o melhor seria levá-las para mergulhar com esses seres fantásticos, como eu faço, mas muito poucas pessoas topariam essa experiência. Imaginei então que um aquário marinho poderia ser a melhor e mais efetiva forma de aproximar o público dos tubarões com o objetivo de desmitificá-los e preservá-los.

No ano seguinte, comecei a sonhar com a possibilidade do Rio de Janeiro ter um aquário de nível internacional, como há muito merece. Com a criação do Instituto Museu Aquário Marinho do Rio de Janeiro, no princípio de 2006, dei início à jornada para realização dessa empreitada.

Um ano depois, ganhei a chamada pública e a cessão de uso do prédio da Ex-Cibrazem na Zona Portuária do Rio. Após alguns anos de árduo e incansável trabalho, com muitas idas e vindas, resistências e obstáculos, no final de 2012, com a parceria do Grupo Cataratas, conseguimos viabilizar o projeto de construção do AquaRio – Aquário Marinho do Rio de Janeiro, um equipamento de visitação pública 100% privado, com 4,5 milhões de litros de água, distribuídos em 28 tanques, cinco andares e 26 mil m2 de área construída.

Focado em educação ambiental de qualidade, pesquisa científica séria e planos de conservação da biodiversidade, com relevantes linhas de investigação científica que beneficiam sobremaneira a conservação das populações que vivem livres nos mares do planeta, e oferecendo ótimas condições de acomodação, exposição e tratamento, sempre pautados pelo respeito à vida e ao bem-estar dos animais, o AquaRio é hoje um importante pilar de sustentabilidade para a sociedade e um moderno equipamento de turismo, lazer e entretenimento, o que só reforça sua vocação e importância para a cidade do Rio de Janeiro.

Seguindo o exemplo dos bons aquários do mundo, como o Monterey Bay Aquarium, nos Estados Unidos, o Two Oceans Aquarium, na África do Sul, e o Oceanário de Lisboa, em Portugal, o AquaRio trabalha pela valorização dos ambientes naturais que ainda restam, permite (e incentiva) que milhões de visitantes conheçam os oceanos e seus habitantes, fortalecendo a consciência da preservação, e impacta positivamente em seus conceitos e atitudes, inspirando-os a fazer a diferença no mundo em que vivemos.

Além disso, considerando que poucas pessoas têm a oportunidade de experimentar a vida marinha in loco, o AquaRio possui também a extraordinária capacidade de reproduzir ecossistemas marinhos para que os visitantes, em um ambiente lúdico e propício, possam se encantar, conhecer, desmitificar, respeitar e querer preservar seus seres. Um provérbio chinês resume muito bem esse sentimento: “Diga-me e eu esquecerei. Mostre-me e talvez eu me lembre. Envolva-me e eu entenderei”.

Tudo isso carrega ainda um componente excepcional e intangível, do qual muito me orgulho. No momento da visita ao AquaRio, naquele ambiente mágico de encantamento dos aquários de grandes dimensões, ao ver a equipe de biólogos trabalhando e fazendo pesquisa, o interesse dos jovens poderá ser despertado com um novo “click” e sua vocação descoberta. Naquele instante, crianças e adolescentes serão captados para a ciência, como eu fui. E o ciclo se fechará.

 

 

Sobre Marcelo Szpilman

Marcelo Szpilman, biólogo marinho, é autor de oito livros publicados, sendo cinco nas áreas de peixes, tubarões e outros seres marinhos. É o idealizador, fundador e presidente de honra do AquaRio e diretor-presidente do Instituto de Conservação Marinha.

 

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